POEMAS PARA BOLINAR A ALMA


(Prefácio ao livro de mesmo nome, que sai da gráfica neste dia 09/02/2021, de autoria do administrador e escritor caxiense Quincas Vilaneto [Joaquim Vilanova Assunção Neto])


*



Como é que se diz mesmo? Sou suspeito para falar de e escrever sobre Quincas Vilaneto.



Afinal, conhecemo-nos desde priscas eras e juntos, na década de 1970, até fundamos em Caxias um tal “Grupo Safra”, de Literatura, com direito a notícia em jornal (O Pioneiro, do especial amigo comum Vítor Gonçalves Neto) e com a participação de outros poetinhas  -- sim, poetas menores, no sentido jurídico-etário do termo. (A propósito, o Vítor Gonçalves, com seu sarcasmo amigo, disse-me, rindo, ante os nomes que o compunham, que o melhor nome para o Grupo seria “Salafra”... Era o Vítor...).


Como humilde revisor e modesto editor desta mais recente obra vilanetiana, tive, ex officio, o privilégio de ler, reler e treler os originais dos Poemas para Bolinar a Alma. 


Diversas leituras, diversas gratificações. Ganha-se ante a densidade poética de Quincas Vilaneto, o domínio do ofício de colocar transcendências em versos. Ganha-se com os surpreendimentos (surpresas com encantamentos) ante o renovar semântico de palavras e frases, de substância e sentido, de signo e significado.


Mas, sobretudo, e para mim particularmente, ganha-se em “caxiensidade” (o amor ao chão natal, Caxias) e em revivências de cores, odores, primores e até amores da minoridade e sabores verbivocais, audíveis, sentíveis e sensíveis na memória da infância.


Sim, embora se coloquem à disposição para o desfrute estético do leitor poroso, os poemas trazem palavras e expressões e traduzem memórias e emoções próprias de quem criançou-se, meninou-se, rapazoteou-se no mesmo habitat espaço-temporal que Quincas Vilaneto habitou e vivenciou. São as palavras com cheiro de terra (a terra natal) e gosto de infância.


Foi assim que, recebendo um livro, ganhei de gode um portátil sistema de teletransporte, com certas palavras e expressões me levando para a mais distante das lonjuras, na mais rica das viagens: a viagem para dentro de si mesmo e a distância entre o agora e o passado para sempre, passado incapaz/impossível de ser outro tempo.



De qualquer forma, as palavras teletransportadoras pareciam estar aqui para mim. Não são carregadas de divindades como o “Shazam!” marveliano, nem mágicas ou médicas como o “Abracadabra”, nem místicas nem ilusionistas como “Hocus Pocus”, tampouco abrem pesadas portas de cavernas e revelam tesouros  -- e ladrões --  como “Abre-te, Sésamo!”... Talvez estejam, as palavras, mais para o pó de Pirlimpimpim, que leva a lugares proscritos pelo mau lobo ou prescritos pelo bom Lobato.



O leitor que teve infância e meninice como a que Quincas Vilaneto e eu tivemos haverá de sorrir e, mesmo em lembrança, encher a boca falando “papocar” (que tanto pode ser “estourar” quanto “lançar”, “atirar”: “Papocou-lhe nas fuças uma banda de tijolo, é besta!...”) . 


E os restos, a sobra? Que nada!... Isso se chama “sobejo”. 


Sem crescimento? Pequeno? Raquítico? Qual o quê!, pois nada diz tanto isso quanto “entanguido”  --  a “medida” com que Quincas se mede a certa altura (!), em sua biografia poético-poemática (“Poemografia”). 


Não esquecer: “De nada me adiantou / comer o coração do beija-flor / para ficar certeiro / na pontaria da baladeira, / [...]”. Uma outra hora quem sabe Quincas poeta-menino lembre também das minhocas que se engoliam para tornar-se bom pescador  --  como os guerreiros índios que canibalizavam os inimigos índios na crença de absorverem o espírito das vítimas e se tornarem mais fortes...


E as expressões d’antanho continuam a surgir ant’olhos: “Não alisa” (não poupa de reprimenda ou castigo); “sem mover uma palha” (não fazer nada); “não pegam mais” (não crescem, não vingam); “fazer de conta” (fingir, simular, fazer as vezes de algo ou alguém);...


Essas e outras palavras e expressões permitidas para menores são só um aspecto da rica e bem lavrada poesia de Quincas Vilaneto. Ao lado e dentro dele, que é diligente pesquisador da História e inteligente colecionador de variado acervo, está o exigente ourives do verso, burilador do poema, cultivador de pérolas verbais, lapidador de diamantes semânticos.


A metapoesia, uma arte de difícil doma, quando os versos conversam consigo mesmos, olham-se no espelho e entrevistam o próprio umbigo, a metapoesia flui, adestrada pelas mãos e mentes vilanetianas: “Eu não faço poema / como quem divide a cama / ou derrama afetos / como quem faz sexo. Não há nada mais abjeto / que o erotismo de liquidação / [...]”. Ou: “Tem poema que de perto / parece que dorme, / serve de travesseiro [...]”. Enfim, “A poesia é assim: / não cura, mas alivia.”


O Autor percebe, “indomável” e atento, que “a rebeldia da cárie / desarruma o sorriso”. Por sua vez, o leitor, igualmente perceptivo, sente sensíveis e sibilantes versos de silêncio, solidão e saudade   --  palavras e sentimentos recorrentes em diversos versos, entre os quais os do poema “Regresso”, em que Quincas, de cara, afirma, altaneiro e quiçá orgulhoso: “Eu nasci aqui / [...]”.  Aqui em Caxias, que é lugar que caxienses com caxiensidade não comparam a outro, até porque, como poético-magistralmente finaliza o escritor: “Nenhuma outra cidade / é tão aliciante. Nenhum outro caminho / me reconhece pelo cheiro.” Arrasou! Lacrou!


*


Tome, leitor, este livro e abra-o. Conceda ao Autor o benefício da leitura e da certeza  -- pois, como está aqui, em um “Poema perdido”, “não se pode negar abrigo / a quem desafia as palavras”.


EDMILSON SANCHES

Editor

Administração - Comunicação - Desenvolvimento - História - Literatura

PALESTRAS, CURSOS, CONSULTORIAS: 

E-mail: edmilsonsanches@uol.com.br

Site: https://edmilson-sanches.webnode.com/


Fotos: As várias faces da obra e seu autor. Na última foto, Joaquim Vilanova Assunção Neto (Quincas Vilaneto) em solenidade no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias, com os escritores caxienses (a partir da esquerda) Rodrigo Baima, Wybson Carvalho, Arthur Almada Lima Filho, Erlinda Maria Bittencourt e Edmilson Sanches.

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